Raoni lança autobiografia e faz alerta sobre a Amazônia em “Memórias do Cacique”

Créditos da foto: Wikimedia

O líder kayapó Raoni Metuktire relata quase um século de lutas pelos direitos indígenas, alianças globais e alerta sobre a preservação da Amazônia.

Publicado neste mês pela Companhia das Letras, “Memórias do Cacique” marca a estreia da autobiografia de Raoni Metuktire, uma das maiores lideranças do povo Metyktire-Mebêngôkre (Kayapó). Em 296 páginas, Raoni narra, pela primeira vez, quase um século de dedicação à proteção da floresta e dos direitos indígenas, além de recordar alianças internacionais que ampliaram sua luta mundo afora.

O livro é fruto de mais de 80 horas de entrevistas, todas realizadas entre 2020 e 2023, em sua língua materna, o mebêngôkre. As conversas com seus netos, feitas em meio à comunidade, garantem autenticidade ao relato. Posteriormente, todo o material foi traduzido por uma equipe de tradutores Mebêngôkre, coordenada pelo antropólogo Fernando Niemeyer, responsável ainda pela apresentação e redação final da obra.

Além disso, a publicação apresenta um prefácio de Ailton Krenak, referência intelectual indígena, e traz nas orelhas o depoimento de Davi Kopenawa, líder yanomami e defensor internacional da floresta. Ao longo da narrativa, Raoni compartilha desde lembranças de sua infância nômade em Kapôt (MT), passando pela adoção do botoque labial — símbolo cerimonial dos kayapó — até episódios decisivos de sua trajetória.

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Críticas, lembranças e parceria

Ao misturar mitos, relatos pessoais e acontecimentos políticos pouco conhecidos, o cacique revela, por exemplo, que foi levado pela Força Aérea Brasileira em 1967, sem saber, para ajudar em uma missão de busca a Che Guevara na Serra do Cachimbo, só entendendo o contexto décadas depois.

No livro, Raoni também detalha diálogos importantes com figuras como os irmãos Villas-Bôas e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com quem esteve na rampa do Planalto em 2023. Não por acaso, ele faz críticas contundentes ao marco temporal, que considera “injustiça que ignora nossa memória” e ameaça para as demarcações indígenas.

No cenário internacional, destaca-se a histórica parceria com o cantor Sting, com quem percorreu a Europa a partir de 1989 denunciando o desmatamento, e reconhecimentos como o título de Cidadão de Honra de Paris pela UNESCO e a Legião de Honra da França, recebida em 2024.

Agora, prestes a completar 90 anos, Raoni anuncia que irá formalizar sua sucessão em agosto, garantindo a continuidade da luta indígena. Assim, “Memórias do Cacique” torna-se não apenas um documento pessoal, mas um símbolo político e cultural para o Brasil, ao ressaltar a necessidade urgente de se ouvir, de fato, os povos originários na construção da democracia e da preservação da Amazônia.

Fonte: Revista Fórum

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