É possível eliminar os agrotóxicos presentes na água? Qual a melhor forma de lavar os alimentos de forma a retirar os produtos defensivos fitossanitários? Cultivo orgânico é possível no Brasil?
Histórico do veneno: Brasil, o país do agrotóxico
O uso de agroquímicos na produção de alimentos e a contaminação das águas potáveis é um tema debatido há bastante tempo pelo poder público e especialistas. Nos últimos anos o assunto ganhou ainda mais destaque, porque o Governo Bolsonaro, flexibilizou o uso de substâncias químicas, facilitando o registro de novos compostos.
Para ter uma ideia da dimensão do problema, o Brasil lidera o ranking dos países que mais gastou com agrotóxicos no mundo, segundo informação da ONU (Organização das Nações Unidas). E não para por aí!
De acordo com o Censo Agro de 2017, divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o uso de pesticidas aumentaram 20% na última década.
Como se não bastasse a contaminação dos alimentos, a água que sai da torneira também está infectada.
Os dados do Ministério Público coletados de maneira conjunta pelos veículos de jornalismo Repórter Brasil, Agência Pública e Public Eye, identificaram que 92% da água de torneira examinada no Brasil têm algum tipo de veneno.
A situação é realmente preocupante. Dezenas de pesquisas já afirmam que os pesticidas encontrados em alimentos e na água, podem causar sérios dados à nossa saúde.
Nesse artigo científico, por exemplo, a autora verificou que os principais metais encontrados nos agrotóxicos são o mercúrio, arsênio, cádmio e chumbo. Esses elementos, se ingeridos em uma determinada quantidade, podem causar neurodegeneração, perda de concentração, deficiência de memória, contribuem no desenvolvimento de câncer, entre os problemas.
Diante de tanto veneno, resta saber se existe alguma forma de eliminar os compostos químicos antes de consumir os alimentos e a água. Para isso, conversamos com especialistas no assunto e analisamos artigos científicos sobre o tema.
É possível eliminar os agrotóxicos da água?
“Ainda não existe um processo bem sucedido que garanta a purificação da água, uma vez que o pesticida a atingiu”, afirma a nutricionista Raphaella Cordeiro.
A especialista explica que quando a substância química atinge um rio ou uma nascente, o pesticida sofre transformações em decorrência da luz solar e da oxidação. Com isso, formam-se novos compostos chamados de subprodutos. Em decorrência desse processo, aumenta-se as dificuldades de purificar a água.
“Um agrotóxico pode ter um, dois, três ou até mais subprodutos, por isso é complicado algo que garanta a eliminação dos pesticidas na água. Nem as águas engarrafadas está totalmente livre desta contaminação”, relata.
É importante reforçar que as garrafinhas de água contém outras substâncias químicas em excesso.
Segundo um levantamento da Sociedade Americana de Química, a água dentro de recipientes plásticos pode conter quase 23 mais vezes de microplásticos que a água da torneira.
Raphaella também explica que os filtros de barros e os purificadores, apesar de muito eficazes contra microorganismos, também não são capazes de retirar os compostos químicos.
“Infelizmente ainda não existe nenhuma forma que elimina totalmente os agrotóxicos da água”, afirma.
Qual o melhor método para limpar os agrotóxicos dos alimentos?
Somente no ano de 2021, o governo de Jair Bolsonaro liberou cerca de 550 novos agrotóxicos para o uso, somando os três anos de gestão já foram 1.552 produtos químicos. Muitos deles proibidos no mundo inteiro.
Com tantas substâncias sendo utilizadas pelos agricultores, a real: é impossível evitá-las.
Infelizmente, assim como a água, não existe um método capaz de eliminar todo agroquímico contido nas comidas. O que pode ser feito, é apenas reduzir as substâncias presente na casca (de alguns alimentos), o que está muito distante de garantir uma alimentação 100% livre de químicos nocivos.
Sim, apesar de alguns agrônomos ligados a latifundiários diminuirem o impacto dos agentes de controle ambiental na nossa saúde, diversos estudos comprovaram que são potencialmente nocivos. Alguns dos problemas revelados são:
- Câncer;
- Diminuição do pênis;
- Atraso Mental;
- Atraso de psicomotor;
- Transtornos de Atenção;
- Transtornos do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH);
- Transtornos Globais de Desenvolvimento;
- Queimaduras nos órgãos internos;
- Tonturas;
- Cegueira;
- e até suicídio.
Dito isso, é importante ressaltar que alguns alimentos recebem o agrotóxicos internamente.
Nesse caso, não existe nem uma forma de reduzir os danos á saúde. A nutricionista Andréa Esquivel explica que existem dois jeitos de aplicar os pesticidas: pela superfície ou via sistêmico. O segundo é inserido na comida de forma interna, por meio da compostagem durante o cultivo ou pelo tronco.
“Um exemplo são as bananas, que o composto químico é insertado direto no tronco da fruta. Nesse caso não há o que fazer, pois os compostos penetraram na comida”, explica
Para os alimentos que recebem os agroquímicos na superfície, existem algumas técnicas que reduzem parcialmente a quantidade de substâncias nas cascas.
Uma pesquisa publicado no site científico Journal of Agricultural and Food Chemistryal comprovou que uma solução de água e bicarbonato de sódio é eficaz na limpeza das cascas de maçãs. Porém, o experimento foi feito apenas com dois tipos de pesticidas (e apenas com um tipo de maçã).
Outro estudo com tomates, aponta que processos de enxágue com água de torneira e bicarbonato de sódio removeram acima de 61% dos resíduos do agrotóxico ditiocarbamato mancozeb, mas apenas aqueles presentes na película externa.
Novamente, todos os métodos tem apenas alguma eficácia para limpeza superficial. Porém, nenhum estudo comprovou que tais técnicas funcionam completamente com todos os tipos de agrotóxicos, frutas e vegetais.
A solução contra os agrotóxicos são alimentos orgânicos?
Sem um método de lavagem que retira 100% as substâncias químicas de todo o alimento, o cultivo orgânico acaba sendo apontado como uma das poucas soluções para o dilema do agrotóxico no Brasil.
No entanto, o tema divide opiniões.
De um lado, alguns especialistas afirmam que é inviável a produção em grande escala de alimentos isento de pesticidas, capaz de abastecer toda população do país, pois, além de não ter áreas de plantio o suficiente, os custos acabam sendo altos para o consumidor final.
Para nutricionista Andréa Esquivel as comidas isentas de qualquer pesticidas tem o custo alto e não é acessível para grande parte da população brasileira.
“Quando falamos em solução, temos que pensar em volume. A questão é, nem todo mundo tem dinheiro para produzir e comprar esse tipo de comida. As plantações de orgânicos também estão longe conseguir fornecer comida para toda sociedade, pois não existe área de plantio o suficiente. Então consumir somente alimentos orgânicos está fora da realidade do Brasil”, afirma.
Para ela, a solução está na capacitação dos produtores, visto que, muitos não possuem orientação técnica no uso de agroquímicos.
“O agrotóxico é caro para os produtores. Se eles pudessem, não usava as substâncias, mas os clientes buscam alimentos “perfeitos”, então ele acaba aplicando sem conhecimento prévio. É preciso capacita-los e orienta-los para que diminuam no uso de compostos químicos”, afirma.
Já outras autoridades no assunto apontam que é possível, sim, implantar técnicas de agroecologia em todo território brasileiro, focando na biodiversidade, desde que haja programas públicos de incentivo e um governo atuante no cultivo ecológico.
Lias Goés, fundadora do Cooperapas (Cooperativa Agroecológico dos Produtores Rurais e de Água Limpa da Região Sul de São Paulo), afirma que produzir alimentos em todo território brasileiro de maneira orgânica é completamente viável.
“O Brasil possui uma a terra fértil e muito produtiva. O que precisamos é dar suporte ao homem do campo para que eles se conscientizem da sua responsabilidade e comecem a atuar com o cultivo ecológico. Hoje, existe adubagem orgânica e também é possível produzir bioiscas. O agricultor também consegue ter uma renda vendendo sementes, por isso é preciso orienta-los.”
Além de fornecer alimentos sem uso de agroquímicos para restaurantes e feiras, a Cooperapas também presta suporte aos produtores de São Paulo e busca incentivar o agricultor convencional a migrar para as plantações agroecologia.
Para Lia, a solução seria a criação de mais programas de capacitação e politicas públicas.
“Não vamos mudar a situação de uma hora pra outra. O cultivo orgânico não faz milagres e infelizmente muitos brasileiros não podem escolher o que comer. O que realmente resolveria o problema seria um governo atuante nas questões de saúde, meio ambiente e agroecologia. Com isso deveriam criar um plano de ação para sanar o problema”, afirma.
Para ler mais, acesse o site Almanaque SOS