Lula sanciona lei do licenciamento ambiental com 63 vetos

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, na última sexta-feira (8), com vetos, o polêmico projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que elimina ou reduz exigências para o licenciamento ambiental no Brasil.

Ao todo, foram vetados 63 dos 400 dispositivos propostos pelo chamado PL do Licenciamento Ambiental — apelidado por ambientalistas de “PL da Devastação” — aprovado pela Câmara no último dia 17. Segundo o Planalto, os vetos garantem “proteção ambiental e segurança jurídica” e, além disso, foram definidos após escutar a sociedade civil.

Apoiado pelo agronegócio e por setores empresariais, o texto vinha sendo denunciado por organizações ambientalistas e pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) como grave retrocesso. Entretanto, ao explicar os vetos em coletiva no Palácio do Planalto, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que a decisão foi coletiva.

Assim, “foi um trabalho que, no nosso entendimento, mantém o diálogo com o Congresso Nacional, fazendo com que a gente assegure a integridade do licenciamento ambiental e consiga fazer processos que ganhem celeridade sem a perda da qualidade do licenciamento que é fundamental para proteção do meio ambiente em um contexto de crise climática, perda de biodiversidade e de processos de desertificação”, disse.

Além disso, uma medida provisória (MP) e um outro projeto de lei com urgência constitucional também foram assinados por Lula nesta sexta para recompor, em parte e com outras redações, dispositivos vetados. Desse modo, a MP editada trata exclusivamente da modalidade de Licenciamento Ambiental Especial (LAE), que, originalmente, permitia um licenciamento simplificado para projetos e obras considerados “estratégicos”. Contudo, apesar de manter a nova modalidade criada pelo projeto, o governo vetou a possibilidade de o processo ser realizado em fase única.

Conforme detalhou Marina Silva, a LAE estabelecida pela MP não exclui etapas: “O LAE passará a ser acionado para estabelecer projetos prioritários, que terão equipes destinadas a dar celeridade aos licenciamentos, mas não se permitirá licenciamento simplificado, ou monofásico”. Dessa forma, busca-se conciliar celeridade e rigor técnico.

A secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, sublinhou que a decisão dos vetos envolveu todo o governo, e não apenas um ministério. Ainda segundo Belchior, o trabalho seguiu quatro diretrizes principais: garantir a integridade do processo de licenciamento; dar segurança jurídica para empreendimentos e investidores responsáveis; assegurar os direitos dos povos indígenas e comunidades quilombolas; e incorporar dispositivos que tornem o licenciamento mais ágil, sem prejudicar sua eficiência. Portanto, a orientação foi equilibrar previsibilidade e proteção.

Potencial poluidor e LAC

Entre os pontos centrais, o governo vetou a possibilidade de licenciamento simplificado para empreendimentos de médio potencial poluidor, inclusive a modalidade por autodeclaração. Com isso, a Licença por Adesão e Compromisso (LAC) fica mantida apenas para obras de baixo impacto ambiental.

Assim, “evita que empreendimento de risco relevante, como barragens de rejeitos, realizem licenciamento simplificado sem análise técnica adequada”. Além disso, o PL do Executivo enviado hoje “restringe a LAC para baixo potencial de impacto” e acrescenta limites ao procedimento autodeclaratório, reforçando o controle preventivo.

O governo também vetou dispositivos que transferiam, “de forma ampla”, aos estados e ao Distrito Federal a responsabilidade por definir parâmetros e critérios para licenciamentos. Com os vetos, os estados devem respeitar “padrões nacionais”. Desse modo, prevalecem referências uniformes no país.

Em paralelo, foi vetada a possibilidade de retirar a Mata Atlântica do regime de proteção especial para supressão de floresta nativa, uma vez que o bioma “já se encontra em situação crítica, com apenas 24% de sua vegetação nativa remanescente”. Portanto, manteve-se a salvaguarda legal sobre um ecossistema sensível.

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Povos tradicionais e produtores rurais

Outro veto derrubou o dispositivo que limitava consultas a comunidades indígenas e quilombolas apenas quando seus territórios estivessem homologados ou titulados. Com o veto, os grupos que tenham iniciado o processo de reconhecimento pela Funai e pela Fundação Palmares devem ser consultados. Assim, ampliam-se as garantias de participação. Ademais, foi barrado o dispositivo que dispensava licenciamento ambiental para produtores rurais com Cadastro Ambiental Rural (CAR) ainda pendente de análise.

Segundo o Executivo, “somente serão dispensados do licenciamento os proprietários rurais que tiveram o CAR analisado”. Logo, a dispensa passa a depender de verificação efetiva.

O governo vetou, ainda, dispositivo que limitava ações de compensação apenas aos impactos diretos, excluindo os impactos indiretos. Dessa forma, “sempre que houver nexo de causalidade entre o empreendimento e os impactos ambientais — diretos ou indiretos —, poderão ser exigidas medidas adequadas de mitigação, compensação ou controle”, preservando a efetividade do licenciamento.

Paralelamente, o presidente Lula vetou o artigo que retirava o caráter vinculante dos pareceres de órgãos gestores de Unidades de Conservação quando empreendimentos afetarem diretamente a unidade ou sua zona de amortecimento. Ou seja, com o veto, tais manifestações permanecem obrigatórias, garantindo poder real aos órgãos gestores. Consequentemente, reforça-se a avaliação técnica especializada em áreas sensíveis.

Por fim, outro veto manteve a responsabilidade de instituições financeiras na concessão de crédito em casos de danos ambientais em projetos financiados. “A medida reforça a importância de que o crédito seja condicionado ao cumprimento da legislação ambiental, estimulando a prevenção de danos e alinhando o financiamento ao desenvolvimento sustentável.”

Além disso, o PL do Executivo “estabelece que o financiador deve exigir do empreendedor o licenciamento ambiental antes de conceder crédito”, condicionando recursos ao cumprimento de requisitos.

Em síntese, Lula sancionou o novo marco com 63 vetos entre 400 dispositivos e, simultaneamente, editou uma MP e enviou um PL com urgência para recompor trechos com outras redações. Assim, o governo tenta, ao mesmo tempo, dar celeridade ao licenciamento — por meio do LAE sem fase única — e preservar rigor técnico, segurança jurídica e proteção socioambiental.

Entretanto, pontos sensíveis foram resguardados: a LAC ficou restrita a baixo impacto, a Mata Atlântica permaneceu sob proteção especial, as consultas a povos tradicionais foram ampliadas, os impactos indiretos seguirão passíveis de compensação, os pareceres de Unidades de Conservação continuam vinculantes e as instituições financeiras mantêm responsabilidade preventiva. Desse modo, a diretriz anunciada pelo Planalto busca conciliar desenvolvimento e tutela ambiental em um contexto de crise climática e perda de biodiversidade.

Fonte: Agência Brasil

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